Quando fizemos a entrevista, eu e minhas colegas conversamos com Shulman acerca de seu trabalho, destacando os elementos centrais sobre a profissionalização docente e como as universidades, os formuladores de políticas públicas e os professores podem agir no sentido de valorizar a profissão e torná-la mais centrada na prática.

Eu me lembro, como se fosse hoje, daquela manhã fria do outono californiano. Dia 02 de dezembro de 2018. Eu estava finalizando o meu período como professora visitante na Universidade de Stanford e já sentindo saudade de tudo o que vivi. Fomos recebidas na casa dele, que fica situada dentro do campus e é super aconchegante. Judith, sua esposa, uma profissional fantástica no campo educacional e que também tem diversas publicações, estava lá. Em muitos momentos eles tiveram demonstrações de carinho e afeição. Ela saiu para resolver algumas coisas, mas ele permaneceu conosco, ouvindo-nos com atenção e falando sem qualquer sinal de pressa. Uma pessoa que demonstrou simplicidade e disposição.

Antes de começar a entrevista ele quis nos conhecer, e então cada uma de nós se apresentou, contando um pouco da história com a educação. Ao longo da entrevista ele dava exemplos focados em nossa área de atuação, com o intuito de materializar ainda mais a nossa compreensão. Incrível!

Confira um pouco do que foi a entrevista:

Introdução

Lee Shulman, professor emérito da Faculdade de Educação da Universidade de Stanford, é um dos mais importantes intelectuais e pesquisadores da educação mundial e tem influenciado a reflexão e a concepção contemporânea a respeito da profissão docente. O seu olhar interdisciplinar a respeito de diferentes profissões o levou a uma abordagem original e transformadora acerca da profissão docente e o professor.

Cursou filosofia, psicologia e fez pós-graduação em educação, onde foi aluno de Benjamin Bloom, famoso psicólogo educacional e idealizador da Taxonomia de Bloom, e Joseph Schwab, criador do The Practical, um programa para melhorias educacionais com base em deliberações curriculares.

O que é ser professor?

“O professor é aquele que usa o conhecimento, a experiência, a formação e a bagagem cultural que ele ou ela tem para mexer com os corações e mentes de pessoas jovens pelas quais é responsável. Ele o faz ouvindo os seus estudantes cuidadosamente, falando com eles conforme a necessidade e sempre que for preciso, criando experiências que eles não teriam de outra forma se aquele professor com sua formação específica e seu comprometimento e dedicação não estivessem presentes na instituição que foi criada especificamente para isso.” comentou Shulman.

O que diferencia um professor profissional de pessoas comuns?

“Eu acredito que um professor profissional consiga ensinar muito mais, com condições múltiplas e para grandes grupos, do que uma pessoa sem especificação. Mas uma das coisas mais importantes que um professor profissional sabe é que existem áreas que ele não pode ensinar, por puro desconhecimento. Eu, por exemplo, não poderia ensinar Geografia. Eu imagino que o ambiente submarino, a topografia, os grupos vivos e os movimentos da terra abaixo dos oceanos devem ser uma das fascinantes e importantes áreas da Geografia. Eu sei isso e sei que não posso ensinar esse conteúdo, porque não tenho conhecimento o suficiente sobre ele…” disse o professor.

Além disso, Shulman comentou sobre outra característica pertencente ao professor profissional, sendo a de que ele é estudado para montar o seu plano de aula baseado no que os seus alunos já sabem, ou seja, o profissional se prepara para entender o que está se passando na mente e no coração de seus estudantes, para assim utilizar o melhor método para ensinar o conteúdo.  Em contraste, o intelectual disse que isso é diferente quando se trata de um professor sem formação que, mesmo sendo muito educado, talvez não tenha os mesmos “hábitos da mente” que caracterizam um professor profissional.

Segundo ele, esses professores não possuem as habilidades requeridas para exercer esse tipo de análise ou a profunda integridade e motivação de um professor profissional.

Qual deveria ser o papel das universidades para melhorar a qualidade do ensino, na medida em que elas são responsáveis pela preparação profissional docente?

“Vamos reconhecer que a educação de professores em uma grande universidade, digamos assim, deva ser pensada em paralelo à educação de advogados, enfermeiros, médicos, engenheiros, terapeutas e assistentes sociais. Parte da responsabilidade da universidade é preparar seres humanos para que eles possam utilizar seus conhecimentos e habilidades para transformar o mundo com responsabilidade e para se sentirem completamente responsáveis pela transformação que eles fizeram.

Se a universidade realmente compreender isso, então, inicialmente, ela irá assegurar a oferta de oportunidades suficientes para os estudantes lidarem com problemas da prática e não apenas com as partes mais acadêmicas. Ela irá reconhecer que muito do que contribui para a internalização bem-sucedida de papéis e responsabilidades está relacionada com a interação com profissionais exemplares.” respondeu o professor.

Shulman ainda completou que, caso nem todos os professores das universidades sejam modelos profissionais, a universidade deve trazer pessoas de fora para conversar e passar experiências que agreguem no aprendizado dos futuros professores.

“Eu me recordo quanto eu estava no meu terceiro ano, e um visitante veio, que já era um advogado, e estava dedicando o seu tempo para trabalhar em uma região extremamente pobre e difícil, provendo assistência legal para pessoas carentes. Ele nos contou algumas histórias a respeito, e eu fiquei tão tocado que comecei a chorar, e então eu pensei: ‘que incrível que eu possa ser capaz de fazer o mesmo tipo de trabalho, talvez eu não faça com dedicação exclusiva, talvez eu possa dedicar um dia da semana para fazer isso, ainda que eu esteja trabalhando com outras coisas” contou o intelectual.

Então, segundo ele, trazer pessoas e oferecer aos estudantes oportunidades para lerem romances, assistirem a peças de teatro ou apenas falar a respeito, oferece oportunidades para lerem casos e discutirem sobre eles. Para ele, as faculdades necessitam de líderes universitários que sejam visionários, não especialistas de conteúdo fechados no seu campo.

Quer ler a entrevista na íntegra? Clique aqui e confira tudo que foi debatido nessa prazerosa conversa com Lee Shulman!